sexta-feira, 7 de março de 2008

Brilho




José e Maria tiveram que deslocar-se por muitos quilômetros, até chegar a Belém. Era lá que José deveria registrar-se, no recenseamento exigido pelo decreto de César Augusto. Maria estava grávida, e José, grande homem, cuidava dela com esmero e amor. Mesmo sendo difícil para ele acreditar na versão de que o filho de Maria tivesse sido concebido pelo Espírito Santo, fora obediente à voz de Deus em seu sonho e amoroso para com aquela que daria à luz um filho que não era propriamente seu. Um homem honrado e exemplar, o homem certo para criar Jesus.

Ao buscar um lugar para hospedar-se, José só encontrou portas fechadas. Certamente havia casas boas e bem mobiliadas; casas limpas, amplas, boas para hospedar. Mas, conquanto boas, estavam cheias e indisponíveis, não podiam receber a família do Filho de Deus. Restavam as pousadas pobres e baratas. Contudo, nem nessas José encontrou lugar, pois muita gente, à semelhança deles, estava na cidade para recensear-se.

Foi quando alguém, um “bom samaritano”, condoído da situação, ofertou um lugar que possuía, local inóspito e insalubre, mas que era melhor que o meio da rua, onde se podia deitar e repousar, sem preocupar-se com ladrões e com a chuva. Era um celeiro, um curral, em gruta ou não, era a cocheira onde os animais dormiam, onde eram guardados. Quem conhece os currais sabe qual é o cheiro pela manhã, após uma noite de “movimentos intestinais” no gado. Mas era ali o único lugar disponível. Os palacetes estavam lotados; também as boas casas, e as casas simples também.

Ao cumprir-se o tempo para o nascimento de Jesus, uma Estrela, no Céu, de brilho e dimensão extraordinários, surgiu bem em cima da aldeia, e, talvez em forma de facho de luz, direcionada, brilhou sobre o teto do curral onde estava Maria. Esta, ao dar a luz, viu nascer o maior milagre de todos os tempos, e teve em seus braços o “Deus feito carne”. A estrela brilhou e refulgiu sobre o lugar. Enquanto as casas boas e bonitas estavam fechadas e solitárias, sem estrela alguma, o celeiro de Jesus, lugar malcheiroso e desconfortável, passou a receber visitantes, dos mais modestos aos mais ilustres: os pastores do campo, chamados por anjos a prestar honras ao menino-Deus, após cantata natalina celestial; e os três magos do Oriente, homens ilustres e da mais alta dignidade e nobreza. Homens que traziam consigo os olhos do êxtase e da intensa e profunda admiração. A estrela refulgia sobre o celeiro, e o menino repousava num cocho. E os magos o tratavam como Rei.

O que fez desse celeiro, dessa gruta, desse curral, um lugar inesquecível, foi a presença do Rei dos reis ali, do Senhor dos senhores. Talvez os grandes lugares estivessem já cheios de si próprios, chamando para si mesmos a atenção, e não puderam abrir mão de sua própria auto-estima. Mas um curral, que beleza ou celebridade teria? Nenhuma. Pois foi ali, no mais humilde dos lugares, que Deus fez o maior e mais importante templo do mundo.

Não foi um templo suntuoso por causa de seus bancos de marfim, de seus tapetes persas, de suas colunas gregas, de seus vitrais góticos, de sua nave bizantina, de seus instrumentos musicais clássicos, de seus corais finamente trajados, nem das relíquias ali guardadas. Deus escolheu um lugar sem nada, sem beleza, sem riquezas, sem glórias, sem brilho, sem conforto, sem celebridade, para instalar ali a maior das glórias, das riquezas, dos requintes, dos poderes: foi ali que a Estrela brilhou. Não em outro lugar. Deus quis que a única glória do lugar fosse a Sua própria presença.

Àqueles cujas igrejas não têm o vulto de outras tantas, grandiosas e célebres, àqueles cujas congregações são pequeninas, escondidas, pobrezinhas, inexpressivas, muitas vezes criticadas, de nomes tão medíocres e de condições tão precárias, cabe aqui a lembrança: foi no celeiro paupérrimo que Cristo colocou seu primeiro trono humano, para que a glória não fosse do homem, mas dAquele que adentrou o lugar. Grande deve ser o Senhor que santifica o lugar. Grande deve ser o Nome sobre todos os nomes, e não o nome de quem proclama o Nome. Grande deve ser a mensagem, e não o mensageiro. Grande deve ser o poder do brilho celestial, e não das luzes e luzeiros humanos. A glória só é Glória quando vem do Alto, de cima, de Deus, e que destaca Aquele que santifica o lugar, e não o lugar em si. Uma igreja se torna grande quando seu povo sabe ser pequeno; uma igreja nunca cai quando sabe manter-se de joelhos; uma congregação é vitoriosa, quando sabe que ao Senhor pertence a batalha. Talvez num lugar bem humilde Deus venha a realizar uma obra grandiosa, de salvação, redenção e transformação humanas.

Àqueles que se julgam inferiores e pequeninos, pessoas de segunda categoria ou sem oportunidade para o pleno desenvolvimento ou completa felicidade, que não tiveram as chances que a vida deu a outros, que não passam de pessoas simples, ingênuas, modestas e incultas, também cabe aqui a lição: Belém não era lugar para que um monarca andasse.; quanto mais nascer ali! Contudo, foi naquele pequenino lugarejo, numa das mais humildes vilas de Israel, que o Maior dos maiores decidiu nascer. Não sei onde Alexandre o Grande nasceu, ou Napoleão, ou Getúlio Vargas, ou Nabucodonosor nasceram; precisaria consultar compêndios. Isso não importa muito para ninguém hoje. Mas o mundo inteiro conhece a pequenina Belém, não por seus monumentos e grandeza, mas pelo Rei dos reis nascido menino ali. E, assim, a glória é de quem naceu ali. À semelhança de Belém, se alguém se sente pequenino, que saiba que, ao habitar Cristo o coração, o pobre se faz rico, o inculto se torna douto, o cansado recobra as forças, o entristecido faz-se contente, o desanimado recupera sua energia e o perdido se faz salvo.

Portanto, que o celeiro de nossas vidas, e, não raras vezes, que nossa pequenina congregação-celeiro, continue simples, e que a Presença Divina seja a glória que faz a diferença!


Brilha, Jesus!

Por: Wagner Antonio de Araújo

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